Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Por que tanta pornografia?

Madonna não faz nada para escandalizar ou para provar algo sobre sua própria vida sexual

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As perguntas que deveríamos nos fazer depois de ver tanta desgraça na televisão são: o que podemos fazer para acelerar a transição energética renovável? Ou, como os setores de transporte e indústria podem ser mais sustentáveis? Mas o questionamento que eu continuo vendo é "por que tanta pornografia?".

Madonna durante apresentação da Celebration Tour na O2 Arena, em Londres - Kevin Mazur/WireImage for Live Nation/Handout via Reuters

Nem sinal de vídeos de influencers de Cristo escandalizadas com os estupros registrados nos abrigos no Rio Grande do Sul. Desgraça para essa galera é mulher adulta numa performance artística erotizada. O bonde dos ofendidos quer saber por que tanta pornografia. Fui ameaçada de ser excomungada, como Madonna já foi. Achei chique.

Vamos lá. Porque ainda tá cheio de mulher que não transa, não goza, não se masturba. Que tem vergonha, medo, acha que é pecado, que se dobra a imposições da sociedade e não sabe que sexo é mais para dar prazer do que para procriar, que nós temos aquela maravilha chamada clitóris que existe só para isso e para mais nada. Embora muito homens não saibam onde fica, está cada vez mais em uso. Com eles e, principalmente, sem eles.

Madonna não faz nada para escandalizar ou para provar algo sobre sua própria vida sexual. Faz para normalizar, para mostrar que faz parte da vida, que pode estar em cima de um palco numa apresentação musical, dentro de um quarto, a sós ou com companhia. Sim, tirem as crianças das salas, não é conteúdo para elas. É para adultos, em especial mulheres que ainda não entenderam que conhecer o próprio corpo é liberdade para a cabeça. Orgasmo é melhor do que ansiolítico e trepar sozinha é garantia de orgasmo.

Ao simular uma cena de sexo oral com bailarinos ajoelhados no meio de suas pernas, Madonna manda um recado bem grandão para macho que tem nojinho de fazer sexo oral porque acha vagina um troço feio, sujo, fedido. O que não faltam são mulheres traumatizadas por imagens de xoxotas plastificadas, exaltadas pela indústria pornô e nos consultórios médicos. Uma amiga passou por uma consulta rotineira de prevenção de câncer no colo de útero e saiu do médico com a recomendação de uma ninfoplastia, para ficar com uma aparência mais "simétrica e agradável". Além de cara enrugada estar proibida, temos que ter uma "priquita" jovial.

Em uma das músicas, bailarinas mulheres surgem com calças pretas e peitos de fora. Qualquer que pudesse ser o apelo erótico do nu desaparece assim que homens, com o mesmo figurino, entram no palco e se engajam na coreografia. Sobra apenas a beleza da dança, a harmonia dos corpos num balé que não tinha nada de sensual e que me fez pensar no absurdo da censura dos corpos femininos banidos nas redes sociais.

A "pornografia" de Madonna provoca e acolhe. A cena em que simula uma masturbação em cima de uma cama remete à turnê Blond Ambition, em 1990. A cantora quase foi presa no Canadá. Pelas reações em sua passagem pelo Brasil, faz sentido que ela resgate esses momentos. Mas há algo de poético na encenação que tem a participação de uma bailarina que representa sua versão mais jovem, vestida com o sutiã cônico, desenhado por Jean Paul Gaultier. Ao final da coreografia erótica, a Madonna de 65 anos se deita na cama, acolhida pela Madonna de 30 anos atrás, como se dissesse: está tudo bem, deu tudo certo, aproveite o seu gozo. Serve para ela e para todas nós.

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